terça-feira, 2 de setembro de 2014

Uma nova constituinte não responde a nossas urgências.

O PROBLEMA DO ATUAL PLEBISCITO 


Desde as grandes mobilizações populares de junho de 2013, passando pelas greves de 2014, algo de novo, no passado recente do Brasil, nos foi colocado: a grande insatisfação da maioria da população contra as instituições que controlam nossas vidas e as diversas maneiras de lutar contra o estado de coisas que nos aprisiona, seja no nosso trabalho, no nosso estudo, no bairro que moramos, etc. De fato, a maior parcela da população atem-se às formas mais imediatas de demonstrar essa indignação, mas tivemos greves históricas com ganhos reais ou parciais  conduzida, em boa parte das vezes, pelos trabalhadores, à revelia das direções sindicais. Isso mostra que fazer movimento sindical também é possível, mesmo com sindicatos aparelhados por grupos políticos que os fazem girar em torno de seus próprios interesses e/ou atrelados a patrões.
Como dissemos, foram colocadas em cheque as formas antigas de se fazer política, principalmente as políticas institucionais. O desinteresse dos brasileiros pelas eleições para cargo legislativo e executivo é grande. Transformar a revolta em ação de mudança, na luta pela defesa e ampliação de direitos, bem como na construção do poder popular, não é fácil. A maioria não passou da situação de conforto da crítica, mas não foram poucos os que fizeram greves, como as dos Garis e Rodoviários.
Acreditamos que as mudanças tão sonhadas, aquelas balizadas pela igualdade e liberdade, virão na medida em que o conjunto dos oprimidos se fizer protagonista, e, organizado, lutar com ação direta e na construção do Poder Popular.
Uma parcela dos movimentos sociais atualmente está organizando um plebiscito nacional por uma nova constituinte. No nosso passado recente, vários foram os plebiscitos puxados por movimentos sociais, como o contra a ALCA, pelo não pagamento da Dívida Externa, entre outros. Esses foram importantes instrumentos, pelo menos em potencial, de pressão, propaganda e possibilidade de ampliação de diálogo com o restante da população. Não foram plebiscitos oficiais, por isso, seus resultados não foram oficialmente aceitos, mas promoveram importantes debates.
Um plebiscito oficial, sendo apenas consultivo, não garante poder de mudança nenhum na mão do povo. Um plebiscito oficial, com capacidade direta de decisão da população, pode trazer decisões importantes, mas mesmo assim não seriam decisões centrais. O Estado tem uma estrutura forjada para garantir que as estruturas de domínio continuem privilegiando uma minoria opressora. Mudanças que colocassem em cheque essa situação não poderiam ser promovidas pelo próprio Estado.  
O problema do atual plebiscito proposto por vários movimentos sociais não é seu formato, que já foi utilizado outras vezes, como falamos. O problema desse plebiscito está na forma como ele propôs o diálogo com a população que se revoltou em junho de 2013. Se a revolta da população é contra as instituições (governos, parlamentares de maneira em geral, judiciário, polícias, grandes empresas, etc.), não acreditamos que chamando essa população para uma nova constituinte se resolveria o problema. Depois de tanto esperar para vermos um espírito de revolta nascer em grandes parcelas da população, não dá para queremos conduzir esse espírito de revolta para uma saída institucional.
Querer uma constituinte é apostar numa saída que pode adestrar parte da população para o diálogo com seus algozes: governos e patrões. Vemos as greves espontâneas deste ano como o tipo de saída que apostamos. Educar o povo na revolta, construir protagonistas na ação direta é o que precisamos. Parar a luta para fazer uma constituinte nos conduz a velhas fórmulas que não apontaram saídas para o povo oprimido. Se temos direitos garantidos em lei, foi devido a muita luta de gerações anteriores. Se quisermos acumular mais vitórias e construir o Poder Popular necessário para transformação social almejada, continuemos na luta. 


4 comentários:

Alessandra disse...

Concordo que a saída institucional não é a melhor. Entretanto, o sistema político da forma que está hoje, está sendo muito prejudicial. Milhões tem sido gastos em campanhas oriundos de empresários e isso tem gerado várias ações governamentais arbitrárias que vão contra os interesses do povo. Temos a chance de criar um momento de maior participação popular nas decisões políticas, inclusive para acabar com a obrigatoriedade do voto, uma das aberrações políticas que ainda temos. Portanto eu acredito que os movimentos mais críticos e mais comprometidos com as reais mudanças que necessitamos não deveria descartar completamente esse momento, mas se envolver mais profundamente, para influenciar mudanças mais significativas. Acredito que embora a saída institucional não seja a ideal, a mobilização popular não precisa parar aí. Pelo contrário, relativizando o poder que hoje os setores econômicos tem sobre a política, a luta popular poderá ganhar mais força. Ao contrário, se o poder econômico continua sendo a força maior na definição do nosso destino, a opressão violenta aos trabalhadores continuará com toda força, como foi durante as manifestações, ou até pior.

resistenciapopular-al disse...

A saída institucional para nós não é uma saída Alessandra, é um mero cala a boca, como tudo que veio de proposição para as mobilizações ocorridas em junho de 2013 parar.
Mas a posição real do que o governo quer é uma força repressiva nunca vista antes por nós que vamos as lutas desdo período do governo civil/militar, então, se você ainda considera uma saída, nós não queremos a mesma coisa.

Viralata disse...

Por Viralata da silva - web.infoarte@gmail.com - (facebook) Gilbertovieira89@yahoo.com.br
Quando os blacks bloc, na primeira explicação sobre seu papel nas manifestações do ano passado, 2013, eles disseram ser uma espécie de muralha que garantiria a reta guarda. Uns pseudos protetores do movimento popular. Eles não sabiam que existe uma coisa muito mais estruturada em termos de luta por liberdade, sem paternalismo. Agora eu fico pensando se nós anarquistas não estaríamos propondo práticas tomadas à priore do movimento popular. Aquele comentário de Alessandra quanto ao voto ser facultativo ou não, refere-se a conceitos que não estamos habituados e que muito nos serviria como pauta para discussões mais profundas como por exemplo: Desejamos uma sociedade baseada em uma funcionalidade biológica. Porquê ela existe! Afinal, é a base de nossa bandeira libertária. As propostas de mudanças nesse jogo político(reformas), dever reforçar o conceito da coisa libertária. O conceito, somente.

Marcelo disse...

Até há tempo atrás estava concordando mais contigo Alessandra. Mas por meio de discussões coletivas, entendi o que estava equivocado antes na minha posição. Pode ser que ela não sirva pra você, mas vou compartilhá-la: julgo agora que o erro na minha forma de pensar anterior estava em esperar que alguma reforma do sistema político que efetivamente possa receber esse nome pode vir de um plebiscito que foi apresentado do nada, sem discussão nenhuma nos movimentos sociais (senão talvez por aqueles dominados por forças governistas, tais como o Levante Popular). Uma reforma política só será possível no horizonte na medida em que o Poder Popular, pela pressão das ruas, submeta a decisão política nessa instância institucional efetivamente à Vontade do povo, em que nós sejamos os legisladores, e não alguém de cima! Isso pois entendemos que no jogo do "Estado Democrático de Direito" brasileiro contemporâneo, nem uma reforma é possível! Se despendermos nossa energia e atenção para essa constituinte, colocada do jeito que ela está, vamos ter que no mínimo lidar com as questões que o companheiro anônimo colocou logo acima, e com isso acabamos perdendo o foco daquilo que o texto pontua: fortalecimento das lutas que se deem pela via da ação direta!

até mais!